A musculatura esquelética corresponde a aproximadamente 40% da massa corporal total. Em repouso, suas fibras apresentam baixo consumo de oxigênio, resultando em reduzida densidade de hemoglobina total nesses tecidos. Essa condição, entretanto, se altera de maneira significativa durante o exercício em função da contração muscular.
Quando a intensidade da contração é inferior a 30% da contração voluntária máxima (MCV), a pressão mecânica exercida pelas fibras musculares comprime os vasos, promovendo o esvaziamento sanguíneo local e a consequente redução da concentração total de hemoglobina. Entre 30 e 70% da MCV, a maior tensão muscular gera venoconstrição, aumentando o volume sanguíneo local e, portanto, elevando a hemoglobina total — parâmetro que pode ser considerado uma medida indireta da perfusão regional. Em contrações intensas, superiores a 70% da MCV, a elevada tensão restringe de forma importante o fluxo sanguíneo, produzindo um platô no volume de sangue e reduzindo a saturação da hemoglobina, que se desoxigena para suprir a maior demanda de oxigênio dos músculos ativos.
Simultaneamente, a vasodilatação microvascular, mediada por fatores locais como o óxido nítrico e o dióxido de carbono, atua para aumentar o fluxo sanguíneo nos músculos em atividade, em parte compensada pela vasoconstrição observada em músculos não envolvidos na tarefa. Essa dinâmica é de particular relevância para atletas de endurance, especialmente no ciclismo, pois a modulação da resistência da pedalada permite gerar estímulos específicos de maior ou menor oferta de oxigênio tecidual, de acordo com os objetivos adaptativos do treinamento.
Nesse contexto, evidências recentes demonstram que a cadência ótima de pedalada aumenta de forma sistemática e consistente com a intensidade: de aproximadamente 45 rpm em baixa intensidade até 85 rpm no esforço aeróbio máximo. Em limiares metabólicos característicos, observou-se elevação da cadência ótima de 65 rpm no LT1 até 85 rpm no VO₂max, sem diferenças relevantes entre indivíduos.
Por outro lado, cadências muito elevadas (ex.: 120 rpm) acarretam maior custo metabólico, maior recrutamento de fibras de contração rápida (glicolíticas) e, consequentemente, aumento da concentração de lactato e redução da eficiência bioenergética. Assim, cada limiar metabólico parece corresponder a uma mudança no padrão de recrutamento muscular, refletindo a transição entre diferentes tipos de fibras e vias metabólicas predominantes. Atualmente, tecnologias como o Moxy Monitor permitem acompanhar em tempo real essas adaptações, medindo de forma localizada na musculatura do ciclista tanto a hemoglobina total (tHb) quanto a saturação de oxigênio (SmO₂), fornecendo dados objetivos sobre perfusão, oxigenação e utilização metabólica durante diferentes cadências e intensidades, uma vez que parâmetros tradicionalmente utilizados — frequência cardíaca, VO₂ e lactato — sofrem variações significativas em função da cadência, mesmo quando a carga de trabalho é a mesma.
Portanto, a cadência de pedalada não deve ser entendida como simples questão de preferência individual. Trata-se de um fator fisiológico determinante do desempenho, representando diretamente o padrão de recrutamento muscular e a predominância de vias metabólicas específicas em cada intensidade. Ajustar a cadência em consonância com a carga e o estado metabólico constitui estratégia essencial para maximizar a eficiência, o rendimento e os efeitos do treinamento em ciclistas de estrada.
Referência: Dunst AK, Hesse C, Ueberschär O. Understanding optimal cadence dynamics: a systematic analysis of the power-velocity relationship in track cyclists with increasing exercise intensity. Front Physiol. 2024 Apr 5;15:1343601. doi: 10.3389/fphys.2024.1343601. PMID: 38645689